Monday 1 March 2010

conto do amor que um dia foi muito

(com base nas músicas Amor de Muito e Risoflora, de Chico Science & Nação Zumbi)

O marinheiro voltou com um molambo de fracasso como vela.
A maresia corroeu seus desejos mais antigos.
A ferrugem da espera nos olhos da mulher feita.
E agora?
O que sobrou para dizer um ao outro?
Só areia e lonjura.
Nem as tentações e as vagabundagens foram submetidas, o que daria algum suspense na história. Foi uma ausência engolida a seco. E pronto.

Se olharam, se olharam.

Cada qual com seus "lá dentros" pedrados de arrecifes.

Ela ainda tentou achar no corpo dele um cravo que só ela - e mais nenhuma rapariga - conseguia espremer em suas tardes de calma e ternura.

Ele não se moveu do canto e parecia afundar em suas movedices de criança.
Aí uma brisa intriguenta bafejou nos seus cangotes uma pergunta:
- Por amor ou por besteira?

Ele só quer escutar o que ela quer dizer.
Ele tem uma tatuagem de Corto Maltese no lado esquerdo do peito.

Balada do Mar Salgado, ela decifra.

Seu coraçãozinho de maria-farinha à milanesa não sentia amor nem cócegas de tanto aperto.

Ele pensou "dois perdidos no paraíso", mas nada disse, de tão besta e óbvio que seria quebrar o silêncio com uma loa tão morna.

Será que havia jeito?
Ele pensou em outra coisa:

"Eu sou um caranguejo e estou de andada. Só por sua causa".
Já era algo, mas ela não sabia mais ler os seus pensamentos.

Coisa triste, repita comigo.
Ele pensou melhor: "Quem sabe molhando as ideias com uma cerveja".

Não havia um mascate da espumosa a léguas.
Teria magoado a moça ao ponto?
Lembrou que havia um samba de regeneração batucando na cabeça. Aí tem coisa, suspeitara.

Havia feito sim uma promessa.
DE MUDAR DE VIDA.
Mas como todo homem: memória gasta pela ferrugem do desleixo.
Flores apenas para enfeitar o pós-barraco.
Movediço na frouxa areia de sabotagem.
Chega.

Tramela nos ares, som forte de batida de porta.

Aí ela disse ao vento: "Por que ele está aqui mesmo?"
Deu vontade (nela) de escrever no balãozinho tatuado do Corto Maltese:
"Eu sou um marinheiro fuleiro!".
O mar devolvia à praia esculturas do acaso, como em uma antiga exposição
do artista Paulo Bruscky. Ela gostava.

A tarde mais longa do século.

Quem sabe a breguice de um belo pôr-do-sol nos tire dessa,
ela em raro tic-tac de esperança.

Uma romântica?
"Antigamente", ela respondeu ao seu próprio desconfiômetro.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

Ele afundava com seus pés de pato movediços. Ela ainda tentou dizer coisas.
Mas ele não estava mais à sua altura.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

(Repete até o completo entendimento do sujeito!)

XICO SÁ

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